Quando a palavra renascimento entra em jogo quase imediatamente todos lembram de arte, isso também acontece com você? Se sim, você pode ter comprado uma imagem desse movimento sem ter entendido as nuances.
Por isso, iremos falar do Renascimento como uma revolução cultural ocorrida na Europa no fim da Baixa Idade Média.
Se você ficou com interesse sobre a Europa pré-renascentista confere o texto Feudalismo: formação, apogeu e crise do sistema feudal.
Contexto histórico
O Renascimento é um movimento que tem a data histórica localizada no século XIV, XV e XVI. Sendo que o movimento renascentista é um importante momento de transição da Idade Média para a Idade Moderna, influenciando na mentalidade e cultura.
Nos séculos XII e XIII, como efeito das cruzadas e do início do êxodo rural, as rotas comerciais, o comércio, as trocas monetárias e a moeda voltaram a acontecer tirando importância dos feudos. Esse movimento se mostra essencial para que o capital gasto no financiamento do renascimento possa ocorrer.
Mas como assim financiamento? Quer dizer que o Renascimento foi uma revolução planejada? Não exatamente…
Com o reavivamento das cidades também surgia uma burguesia composta por pessoas intermediárias entre a nobreza e os servos. Buscando se aproximar da importância e poder da nobreza, a burguesia investia no mecenato, garantindo proteção para artistas e intelectuais em troca do aumento e valorização dos protetores.
A Igreja Católica também utilizava dessa ferramenta em busca do enobrecimento da arte cristã.
E falando na Igreja Católica, é também nesse momento que a Revolta Protestante acontece, criando feridas nos moldes e influência da Igreja Católica. Contribuindo para uma redução da mentalidade medieval feudal muito baseada no teocentrismo.
Características do Renascimento
Até aqui, o Renascimento sofre influência do reavivamento do comércio e cidades, iniciando a base capitalista, da busca pela superação da mentalidade medieval, valorizando o ser humano e retirando Deus do centro das preocupações mundanas. Tendo na Itália o berço da revolução, onde Florença vai se tornar a cidade mãe dos artistas e intelectuais renascentistas.
Agora vamos entender melhor quais são os traços e características de pensamento, arte e visão de mundo, tipicamente renascentistas:
Humanismo
O humanismo é proveniente do aumento da instrução formal universitária, gradualmente os textos teológicos deixaram de ser os únicos a serem estudados, os autores clássicos começaram a fazer parte do currículo.
Influenciados pela filosofia e poesia, os intelectuais renascentistas passaram a propor um olhar que valorizasse o ser humano, acreditando que a valorização humana não precisava ser ligada a Deus. Os humanistas não eram contrários a Deus, mas acreditavam que o ser humano era pleno em potencial justamente por ser a imagem e semelhança Dele.
Antropocentrismo
A noção humanista de que o homem era completo por si só e dotado de um potencial infinito vai ser base para o antropocentrismo. Essa característica do olhar renascentista retira a teologia do centro da vida humana colocando o homem racional nesse lugar antes ocupado por Deus.
A base desse pensamento é que o ser humano seria a obra mais perfeita do universo e da natureza.
Racionalismo
Se desvinculando da Idade Média, onde a autoridade divina e o misticismo eram a base do raciocínio, o Renascentismo vai exigir que a racionalidade humana seja valorizada.
A lógica clássica, o pensamento racional e a ciência irão tomar o lugar de instrumentos capazes de apontar caminhos e verdades.
Postura Crítica
A postura crítica se relaciona com a valorização da ciência, ou cientificismo. Ao colocar a ciência como a melhor forma de obter evolução tecnológica e humana, os renascentistas exigiam dessa imagem de homem moderno um olhar crítico, capaz de diferenciar fatos e valores.
Também pode-se apontar para uma relação com o rompimento com o misticismo medieval, onde valores se confundiam com informações e fatos.
Individualismo
Uma obra perfeita do universo e da natureza com toda certeza é capaz de falar de si própria, ou seja, o homem se conhece individualmente. A quebra da imagem de coletivismo necessário para o conhecimento humano individual vai ser base para o individualismo, uma característica que afastará a imagem do homem como submisso a forças maiores.
O individualismo vai ser fundamental para a valorização das liberdades individuais e as bases da sociedade capitalista.
Naturalismo
O aumento da valorização da natureza também se relaciona com o cientificismo. A natureza era considerada a detentora dos conhecimentos ainda por descobrir, era a partir da observação natural e através do pensamento racional que se colocaria a humanidade em avanço.
Um outro detalhe é que o naturalismo também remete a esse homem como criação perfeita da natureza, de certo modo, o mestre da própria mãe.
Retomada dos valores clássicos
Como os renascentistas enxergavam na Idade Média um período de regressão da humanidade, muito devido a pouca expansão da ciência e da influência teológica, o olhar de referência se voltou para o período clássico. As obras inspiradoras do Renascimento eram clássicas, da Grécia Antiga ou da Roma Antiga.
Os renascentistas buscavam apagar a Idade Média como um momento de progresso da humanidade, o que se mostrou como uma visão equivocada acerca dos 1200 anos medievais.
Universalismo
Se refere ao desenvolvimento inicial da Educação Renascentista. A ideia era expandir o conhecimento e o olhar científico para diversas áreas da vida humana, estabelecendo múltiplas ciências.
O universalismo influencia os autores e artistas da época que buscavam dominar com maestria várias áreas do saber. A noção central era da busca pelo conhecimento verdadeiro e absoluto.
Hedonismo
Na Idade Média a noção de que o sofrimento e a dor se ligavam a libertação da alma humana se mantinha pelo teologismo.
No entanto, durante o Renascimento a noção que poderia ser alcançada a salvação sem a necessidade da valorização do sofrimento ganha importância. Nasce desse contraste de pensamentos o hedonismo, uma valorização dos prazeres sensoriais, carnais e humanos.
Mecenato
Como já mencionado, o mecenato era um “sistema” de proteção aos artistas e intelectuais por parte da burguesia, nobreza e clero. É a partir do mecenato que obras como as de Leonardo Da Vinci são construídas.
Os desejos e projetos artísticos dos burgueses que permitiam que os artistas e intelectuais vivessem plenamente para o desenvolvimento da própria arte e intelectualidade.
Busca pela perfeição
Por fim, mas não mesmo importante, a constante busca pela perfeição. Os renascentistas se inspiravam em obras clássicas e a perfeição artística foi um valor clássico resgatado. Além disso, a busca pela perfeição harmonizava com a noção da representação da perfeita natureza humana e da racionalidade.
Renascimento italiano
Como você já sabe, a Itália é considerada o berço do movimento, e isso não se deu por acaso. A organização política da época era fragmentada. Vários estados se estabeleciam dentro da mesma nação, e todos estavam interessados em reafirmar o próprio poder.
Em grande parte, o mecenato proveniente de figuras políticas se ligava a legitimação cultural dos modelos políticos italianos.
Em termos de economia, a coisa também era favorável. O país tinha várias cidades localizadas em pontos estratégicos de rotas comerciais importantes, as cidades italianas se beneficiavam da lucratividade do comércio. O dinheiro não era um problema para o Renascimento.
O acesso comercial privilegiado também favorecia o intercâmbio cultural e acirrava os ânimos em relação às representações artísticas medievais. Além disso, o acesso a obras clássicas era relativamente fácil. Em resumo, muitos fatores contribuíram para o movimento de Renascimento.
Na Itália, o naturalismo e o humanismo são pontos-chaves para a compreensão das obras renascentistas. Pintores, escultores e intelectuais vão valorizar muito esses dois pontos. É nesse período que se forma a técnica de pintura em perspectiva, a disseminação do uso de tinta a óleo, o jogo de claro e escuro, assim como o trabalho com cores vibrantes.
É possível falar de quatro importantes momentos da Renascença Italiana:
- Proto Renascimento;
- Primeiro Renascimento;
- Alto Renascimento;
- Renascimento Veneziano.
Esses quatro estágios falam do processo que parte da ruptura com a arte bizantina até o alcance de estilos de pintura mais atmosféricos e de cores vibrantes.
Nomes importantes do Renascimento Italiano:
- Giovanni Bellini (1430 – 1516) — Veneza;
- Leonardo da Vinci (1452 – 1519) — Florença, Milão, França;
- Michelangelo Buonarroti (1475 – 1564) — Florença, Roma;
- Raffaello Sanzio (1483 – 1520) — Umbria, Roma;
- Donatello (1386 – 1466) — Florença;
- Sandro Botticelli (1445 – 1510) — Florença, Roma;
- Pietro Lorenzetti (1280 – 1348) — Siena Nicolau Maquiavel (1469 – 1527) — Florença, Roma.
Renascimento e Literatura
Antes de adentrar nos movimentos literários que se associam as influências do Renascimento é importante falar de dois marcos que possibilitaram a disseminação de ideias.
O primeiro deles é a adoção da língua nacional, durante toda a Idade Média as obras literárias eram produzidas em latim o que reduzia o acesso para os não clérigos, a partir do século XIII os autores italianos passaram a publicar na língua nativa.
O segundo fator é o livro impresso, a técnica se desenvolveu no século XIV por Johannes Gutenberg, o que possibilitou a maior circulação de ideias.
Essas duas mudanças representaram um grande avanço para a propagação das ideias renascentistas por toda a Europa. Aos poucos os modelos literários baseados na teologia coletivista perdem peso e abrem espaço para obras influenciadas pelo humanismo e a universalidade.
O classicismo é o grande representante desse momento de Renascença. Durante todo esse período a literatura se aproxima das regras e valores clássicos, as obras literárias seguiam rígidas regras de composição e os poemas eram decassílabos.
Em relação as temáticas abordadas, se via uma maior aproximação em relação aos conteúdos humanos, o reavivamento do amor platônico, histórias de heroísmo e desbravamento ganham foco. Vale lembrar que o momento de expansão marítima também influencia nas temáticas.
A obra literária Os Lusíadas de Luís Camões é um exemplo peculiar dessa conjunção de momentos. Ao mesmo tempo que valorizava os movimentos marítimos portugueses, a obra seguia regras clássicas de composição e buscava inspirações em epopeias clássicas como Odisseia e Ilíada.
Revolução Científica
O Renascimento vai postular que as necessidades humanas deveriam ser levadas em maior consideração, assim como exigir um senso crítico mais aprofundado a cerca das premissas de explicação do mundo. Essas ideias combinadas ao protestantismo e a impressa vão possibilitar o momento de inflexão nos moldes da ciência.
Até o século XVI a palavra ciência e filosofia se referiam a mesma coisa, os estudos físicos, químicos, astronômicos e matemáticos se ligavam ao desenvolvimento das hipóteses filosóficas. A grande preocupação era em explicar o porquê o mundo é como é.
A partir do momento que se coloca em foco as necessidades humanas, a explicação do porquê perde relevância perante o como, ou seja, se tornou fundamental entender o como as coisas funcionam.
Em outras palavras, para a ciência passa a ser irrelevante entender o porquê a água tem três estados: sólido, líquido e gasoso, mas é fundamental compreender como ela passa de um estado para o outro. Esse exemplo pequeno demonstra a sutileza do que se torna o rompimento da ciência com a filosofia.
A partir disso se desenvolveu vários ramos da ciência, cada qual preocupado em explicar uma parcela de como o mundo funciona. O rigor científico, a metodologia científica, a divulgação acessível dos resultados da ciência são efeitos da Revolução Científica.
A ciência passa a se movimentar para atender as questões e necessidades humanas relevantes, sem se ater a uma única doutrina ideológica.
Importantes nomes da Revolução Científica:
- Nicolau Copérnico (1473 – 1543);
- Galileu Galilei (1564 – 1642);
- René Descartes (1596 – 1650);
- Christiaan Huygens (1629 – 1695);
- Isaac Newton (1643 – 1727).
O Renascimento foi um importante momento da história europeia, representante de parte significativa das transformações culturais e sociais que trazem base para a Idade Moderna. Esperamos que você possa ter compreendido melhor as implicações do Renascimento para além da arte.